Avançar para o conteúdo principal

SPEAK - Share Your World



"O SPEAK  junta pessoas recém-chegadas e locais a viverem na mesma cidade através de grupos de línguas e de eventos de intercâmbio cultural organizados pela comunidade. Através destas experiências, os participantes aprendem uns com os outros, exploram interesses em comum e fazem novos amigos, ao mesmo tempo que quebram barreiras e preconceitos na sua cidade."       

Em Novembro de 2013 tomei conhecimento do projeto SPEAK Social.  Em 14/11/2013 tudo começou assim:


O SPEAK Caldas arrancou em 01 de Março de 2014 sendo a primeira cidade a replicar este projeto de inovação social. Esta data é importante para mim porque depois dela passei a ser outra pessoa.

A Associação Fazer Avançar, na altura sediada em Leiria, facilitava a troca cultural e linguística entre pessoas de diferentes nacionalidades a residir naquela cidade. Foi a resposta à necessidade de integração social que estrangeiros sentiam quando vinham residir para Portugal e de portugueses noutras parte do mundo. Resposta que tem sido importantíssima, e reconhecida, no acolhimento a refugiados.

Hoje o projeto encontra-se replicado em 24 cidades de 12 países envolvendo uma comunidade de 56 mil pessoas que representam 202 países. Existem grupos envolvidos na partilha de 60 idiomas o que dá para perceber o valor e impacto das interações sociais no desenvolvimento de comunidades mais inclusivas. Tem ganho prémios e sido reconhecido por organizações europeias e internacionais de referência em áreas de inovação e empreendedorismo social integrando a rede de Ashoka Fellows.

A inovação do projeto são os eventos culturais que envolvem participantes e comunidades, onde as interações sociais se reproduzem criando as tão importantes redes de apoio. Património, eventos temáticos ou simples encontros no café, são exemplos mas o limite é a criatividade.


Há uma frase que integra as causas do SPEAK de que gosto particularmente: "posicionamo-nos do lado da liberdade. Se há algo que ajuda alguém a ser mais livre , somos totalmente a favor (exceto fugir da prisão)". Equilibra a liberdade com o conceito de ética.

O que me apaixonou foi a capacidade de um projeto social que, para responder a um problema de integração comunitária através do mecanismo simples de aprendizagem de idiomas, extravasasse o seu impacto para áreas tão importantes da Formação ao Longo da Vida, como a eliminação de barreiras culturais, a quebra do isolamento de quem chega a um local desconhecido e à criação de redes comunitárias de apoio . O que me transformou foi a proximidade a pessoas. O ouvir historias de vida e poder contar a minha, num processo ausente de julgamentos ou discriminatório, tornou-me melhor pessoa.

Na medida da Teoria Bio-Ecológica de Bronfenbrenner em que os contextos sociais definem e provocam o desenvolvimento humano, o SPEAK permite a constituição de relações proximais, dentro do micro-sistema (Papaia, 2013:68), reciprocamente positivas entre participantes e comunidade. Isto porque a possibilidade de um nativo poder ensinar o seu idioma, partilhar a sua cultura e experiências vividas no seu país permite manter uma relação saudável com as suas memórias contribuindo para o seu bem estar psicológico. E nosso, porque ao ouvir, compreender e respeitar, contribuímos para isso.

A tipologia de educação do projeto é não-formal, vivido ambiente informal de aprendizagens e partilhas de culturas. Não há aulas mas sessões, não são alunos são participantes, os professores são "buddies" e não ensinam, facilitam. Qualquer pessoa pode participar nos grupos de idiomas como participante ou como buddie. Não há pré-requisitos.

Mas onde os valores se projetam mais é na inclusão de minorias, como os refugiados, grupos em situação de exclusão e que procuram no projeto soluções para além das aprendizagens linguísticas como o acesso a emprego e saúde.  A forma como nos construímos é influenciada pelas sociedades em que nascemos (i.e., incorporamos as imagens estereotipadas que a permeiam) mas também na forma como defino os meus objetivos quanto à pessoa em que me quero tornar (Lima, 2018:26). Creio que, a minha paixão por este projeto foi a forma, hoje consciente, de encontrar a consistência cognitiva relativamente às minhas crenças e de redução do desequilíbrio interno provocado pela ideia do “nós” e os “outros” (Gleitman, 1986: 471).

Hoje, na era do desenvolvimento sustentável, projetos de educação inclusiva, como o SPEAK, ganham relevância porque são uma das melhores formas de reduzir crenças e estereótipos pela integração de grupos socialmente excluídos nas comunidades locais. Através de projetos de empreendedorismo social, como o SPEAK, com significado efetivo sobre a vida das pessoas, desenvolvem-se processos de aprendizagem biunívocas, que aumentam a possibilidade de se conseguirem papeis mais ativos e estáveis nas comunidades onde todos estamos inseridos.


A língua de acolhimento é uma das maiores barreiras, e ao mesmo tempo um enorme desafio na integração de refugiados, e não serão poucos os casos em que as experiências partilhadas são um forte e imprescindível contributo para a sua inclusão. O SPEAK tem um papel fundamental na sua integração, promovendo atividades que incentivam a capacidade de expressão e comunicação na língua materna, sendo a aprendizagem de idiomas um veículo de integração social imprescindível ao desempenho da sua cidadania e assegurando a sua promoção social.

Mas não só, segundo Sigman (2018: 114) se por um lado os nossos atos egoístas convertem-se em crenças negativas sobre os outros (são terroristas), por outro a ambiguidade nas crenças dos outros (podem ser terroristas) faz com que sejamos egoístas e agressivos. Forma-se um círculo vicioso cuja interrupção apenas é exequível desde que as relações sociais sejam consolidadas na certeza e na confiança. É esse circulo vicioso que o SPEAK quebra abrindo espaço para o que Anthony D. Smith (1999),  chama de "círculos concêntricos de identidade" onde os participantes sentem-se envolvidos em pertenças de identidade múltiplas apesar de cada um ter a sua identidade.



Referências

Gleitman, H. (1986). Psicologia . Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

Lima, M. P. (2018). Nós e os outros: o poder dos laços sociais. Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos.

Papalia, D. & Olds, S. (2013). Desenvolvimento humano, (12ª ed.). Porto Alegre: Artmed Editora

Sigman, M. (2018). A vida secreta da mente. Lisboa: Temas e debates - Circulo de Leitores.

Speak Social. (s.d.). Fonte: Speak.social: https://www.speak.social/pt/

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Link Me Up - 1000 Ideias

  O projeto Link Me Up - 1000 Ideias é um processo de co-criação e de capacitação para o empreendedorismo e uma ferramenta de inovação e aprendizagens que liga o ensino politécnico superior ao tecido empresarial privado, público ou associativo.  O projeto é co-promovido por 13 politécnicos constituindo as diversidades regionais um fator de aprendizagens variadas e partilha de boas práticas. Partindo de um desafio lançado por uma entidade, são criadas equipas multidisciplinares que integram  estudantes de diferentes áreas de conhecimento, que em conjunto com mentores e/ou facilitadores, promovem um plano de intervenção com base em soluções inovadoras. Entre Março e Junho de 2022 fiz parte de uma dessas equipas multidisciplinares que se dedicou ao projeto denominado "Water as a key resources" um processo de reinvenção (rebranding) de identidade de uma União de Freguesias. Só pelo facto da equipa ser constituída por diferentes perfis pessoais já trouxe valias à experiência e ao

ORDEM DO TREVO

A Ordem do Trevo (OT) é uma associação de voluntários de cariz social com sede nas Caldas da Rainha, criada em Março de 2012 por um grupo de amigos, que intervém junto de famílias carenciadas a viverem neste concelho. A sua atuação principal centra-se na distribuição de alimentos não perecíveis. Nesta intervenção tem como parceiro principal o Banco Alimentar do Oeste e conta com parcerias pontuais de empresas e particulares.   A OT faz parte da Rede Social das Caldas da Rainha onde se senta com mais 8 instituições de solidariedade social que atuam no apoio a famílias socioeconomicamente desfavorecidas. Uma das preocupações maior é atenuar desigualdades, em educação e saúde, nomeadamente nas crianças. A procura de uma ajuda apropriada a este desenvolvimento tem sido feita através de parcerias com atores locais. Acesso gratuito a centros de explicação, compra de material escolar, acompanhamento junto das escolas, acesso a espetáculos de teatro e cinema são alguns exemplos. A possibilidad