A Ordem do Trevo (OT) é uma associação de voluntários de cariz social com sede nas Caldas da Rainha, criada em Março de 2012 por um grupo de amigos, que intervém junto de famílias carenciadas a viverem neste concelho. A sua atuação principal centra-se na distribuição de alimentos não perecíveis. Nesta intervenção tem como parceiro principal o Banco Alimentar do Oeste e conta com parcerias pontuais de empresas e particulares. A OT faz parte da Rede Social das Caldas da Rainha onde se senta com mais 8 instituições de solidariedade social que atuam no apoio a famílias socioeconomicamente desfavorecidas.
Uma das preocupações maior é atenuar desigualdades, em educação e saúde, nomeadamente nas crianças. A procura de uma ajuda apropriada a este desenvolvimento tem sido feita através de parcerias com atores locais. Acesso gratuito a centros de explicação, compra de material escolar, acompanhamento junto das escolas, acesso a espetáculos de teatro e cinema são alguns exemplos. A possibilidade de praticar um desporto e o acesso gratuito a médicos têm sido também valências muito importantes para o seu bem estar.
Um outro grupo que merece intervenção focalizada é o dos idosos. As baixas reformas suportam problemas de saúde crónicos, filhos desempregados e netos que, em muitos casos, são complementadas com rendimento de biscates sofridos.
A preocupação de Durkheim foi separar a educação da pedagogia na qual a pedagogia está associada à reflexão e à elaboração, enquanto a educação está mais do lado das práticas e da ação (2013, 71:91). O que se tem tentado na OT é ligar as duas coisas. Se a utilização de voluntários indiferenciados nas dinâmicas com as famílias ajuda a colmatar necessidades básicas de sobrevivência, como é o caso dos alimentos, a intervenção de voluntários com competências específicas, nomeadamente educativas, na saúde e no desporto, possibilita um trabalho social suportado pelo conhecimento pedagógico. Ao envolver diversos parceiros, no caso os centros de explicação, mas também médicos, empresas, particulares, para além de se tornarem atores sociais, faz com que a comunidade se abra à compreensão sobre a pobreza e crie laços fortes de solidariedade.
Fui voluntário na associação entre 2014 e 2021 e vivi de muito perto experiências com estas famílias. Mais de 50% dos indivíduos, em idade adulta intermédia, têm até ao 9º ano como nível de escolaridade, fator que, segundo estudos científicos da teoria epigenética, pode associar-se a menor desenvolvimento da zona do córtex cerebral, sendo determinante o papel das aprendizagens ao longo da vida e das condições de vida. Excluindo uma discussão determinista, porque ninguém nasce para ser pobre, para além das necessidades básicas, o combate à pobreza requer investimentos multidimensionais. Isto é tanto mais importante quanto sabemos hoje que o ambiente determina comportamentos.
A maioria das famílias que acompanhei são monoparentais ou têm um núcleo familiar reconstituído e, embora a estrutura familiar não seja determinante para o desenvolvimento, vivem em ambientes familiares permeados pela pobreza que, como diz Gopnik (2016:19), não proporcionam ambientes familiares ricos, estáveis e seguros onde a inovação e a novidade possam florir, podendo condicionar negativamente as crianças para toda a vida e, consequentemente, condicionar o desenvolvimento cerebral face à sua maior plasticidade e variabilidade.
Pais ineficazes e fatores socioeconómicos desfavorecidos tornam as crianças mais vulneráveis, menos confiantes e aumentam as probabilidades de ocorrência de perturbações no seu desenvolvimento.
Para além da distribuição de alimentos, uma das missões que deve fazer parte destas instituições é possibilitar a criação de processos sociais, coletivos e participativos, ao nível do terceiro setor, onde as intervenções e aprendizagens são desenvolvidas através de politicas públicas inclusivas e da mobilização da sociedade civil numa logica de cidadania participativa que garantam afetos, seja implicada e transformadora nos domínios do desenvolvimento humano (cognitivo, afetivo e social), para que perspetivas alternativas desafiem os valores dominantes.
Referências
Durkeim, E. (2007). Educação e Sociologia. Coimbra: Edições 70
Gopnik, A. (2016). O jardineiro e o carpinteiro.
Lisboa: Temas e Debates.
Ordem do Trevo. (s.d.). Fonte:
Ordem do Trevo: https://ordemdotrevo.com/
Papalia, D. E.,
& Feldman, R. D. (2013). Desenvolvimento Humano. Porto Alegre: AMGH
Editora Ltda.
Universidade do Algarve. (s.d.). Fonte: CBMR SciencePlatform : http://scienceplatformpt.cbmr.ualg.pt/index.php/2018/06/04/podeapobrezasergenetica/
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